Penso na redução ao abrir o armário da cozinha, agora cedo. Vou pensando, enquanto faço as dobradiças se movimentarem, no quanto algo que se reduz ganha condensação, mas perde fluidez e com ela liberdade. Deve ser por isso que os meus dedos encostam no vidro de vinagre balsâmico reduzido, aquele tempero agridoce para saladas. Numa materialização do que pensava, esse vinagre balsâmico reduzido que tenho nas mãos é mais doce, mais intenso, mais concentrado naquilo que dele restou, mas é também mais denso e viscoso. Escorre com lentidão, mais presa do ar e do limite do espaço do que a sua versão líquida, que flui sobre as folhas de rúcula no prato sem se lhes colar pegajosamente. Gasta-se mais devagar: a redução dura mais tempo que o líquido original. Seu gosto é mais intenso. Nada fica no prato depois de comida a salada e seu gosto permanece na boca do comensal por mais tempo.
Reduzir reduz volume, tamanho, quantidade. Elimina uma parte para que sobre o que, ao olhar, parece essencial. Para onde irá a vida líquida do vinagre em estado bruto e aquoso? O que sofre, na matéria, o efeito da redução? Volátil, espalha-se na atmosfera, funde-se ao nada e torna-se sua partícula. Irrecuperável.
Pessoas, que não são vinagre, não podem ser reduzidas. Precisam de todas as suas partes essenciais; ao contrário do que pensamos não são uma, mas várias. E precisam também de todas as outras, as não essenciais, essas que por vezes parecem tão menores, ou tão maiores, que chegam a assustar os outros.
A manhã de ontem firmou o meu espírito sem reduzi-lo. Devolveu-lhe a luz e o brilho que é dele mesmo, porque provém de onde provém. Deve ser por isso que a minha alma ficou tão leve, tão presente em si mesma. O que mais fazer, a não ser agradecer a semana que vem pela frente, pronta a ouvir, a conhecer, a aprender, sem precisar reduzir-me nem reduzir a vida ao meu redor?