Dos diários II

“Agora que você não está ao meu lado, começo a desabitação da presença. Talvez para que o abandono não me doa. Que o olhar de adeus que você lançou às minhas costas, e que fez os meus músculos se retesarem, não perfure meu espaço aéreo. Qualquer som tornaria concreta a abstração tão grande deste boiar. Por isso desabito-me de você. Imóvel e em silêncio.
Vão faltar-me os nós dos seus dedos ao baterem à minha porta, mas não me interrompo no preparo da mala em que seguirá com você tudo o que nos pertence. Não é preciso que nada fique para trás. Nem um som sequer. Nem um esboço de gesto. Bastam-me as impressões gravadas por todas as paredes desta minha casa, o molde de gesso dos dias somados um ao outro, nesta casa que você habitava até eu perceber o início da desabitação. Quando a dizíamos: nossa casa. Quando assim se tornou, assim que abri a porta e deixei entrar o seu corpo esguio e oscilante, sem perguntar quase nada. Ou perguntando apenas: o que fará comigo quando se for? 
Não houve resposta, e ainda assim deixei você entrar, e o meu espaço tornou-se seu. E o tempo em que os seus passos ecoavam nas escadas de pedra da entrada de baixo fica guardado na áspera gramatura da minha memória. E eu voltarei a ouvi-los, fecharei os olhos e sentirei atrás do meu pescoço o hálito quente do toque das suas mãos. Como se elas tivessem voltado. Como se elas tivessem se reacendido no desejo que palpitará por entre as minhas veias, incendiando todo o meu corpo até chegar ao meu centro.
Dobro-me em duas nessa falta de habitação. Escorro a mobília, tão pouca, ao longo dos corredores encerados. Dobro as cortinas ali encostadas, ainda à espera da escada que nunca veio. Doo a louça ainda nas caixas, à espera de que nos sentássemos um diante do outro, as xícaras e os pires e as taças tremeluzindo nos olhares que trocamos. E de repente passa sobre mim o voo da ave que diz que a vida acaba antes de começar, mesmo quando no início tudo é já tanto. Seus olhos de azeviche, na sua dureza cruel e crua, refletem o meu rosto. Leio nele que sequer ainda começava a ser sua. E no entanto você já se foi.”
(Dos diários de Hope, a personagem nascida no sul)

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