Para escavar entranhas – para isso precisava de uma palavra ontem cedo. Pedi-a ao mundo facebookiano, e o mundo respondeu-me, pródigo. Pus a alma pra fora e fui à vida.
Assim que volto, olho no olho deste mundo virtual; descubro tantas e tantas palavras – mais de 25, o que, na minha conta, é mais que muito. Vinte e cinco presentes aos quais sorrio com admiração, respeito e ternura. Sorrio-lhes com tempo. Demoradamente. Como se lhes dissesse “tou aqui“.
São como gigantes; erguem-se lentos, ainda disformes diante de mim. Desentranham-se dos fundos do alfabeto, como essas vigas que se desencavam da terra. Tantas pessoas (penso) querem dar-me o que digo aqui precisar. Por que resistir-lhes? Vou a elas, com a força que lhes sinto. E o respeito a quem as escreveu. Porque, meu amigo, as palavras que chegam são pássaros que esperam resposta.
Como a fé na palavra sempre. Como a sua conterrânea nunca, não se sabe bem o que quer dizer. E daí o colapso – daí ou de uma questão básica de teoria da linguagem: o pressuposto de que “emissor e receptor devem ter o mesmo repertório para que a mensagem fazendo-se uso do meio conveniente seja expressa por um e entendida da mesma forma pelo outro”. Não gosto de teorias, a não ser quando as vejo florescer na prática. Porque a prática, a prática, a prática – é a prática, é ação, é atitude. E de nada adianta emissor e receptor, não tendo o mesmo repertório, encolherem os ombros porque a incomunicabilidade é a fonte dos seus desentendimentos. Até porque, sinceramente: não é. A fonte dos desentendimentos entre emissor e receptor é, na maior parte das vezes, a desistência na possibilidade da comunicação. Desistir – que bom que ninguém me deu essa palavra de presente. Não gosto de coisas que desistem. Sobretudo seres que desistem.
Sobretudo no amor. Desistir é como uma falha no circuito elétrico: a luz apaga-se, e de nada adianta ficarmos olhando para o espaço escuro, como se a culpa pela falta de iluminação fosse dele, e não do interruptor que ainda guarda o calor do nosso dedo. Tanto faz que o tempo passe, que o outro nos diga “você é tao querida“. Aquele bordado de meses, aquela renda delicada e fina que uns cuidaram e outros observaram dizendo-se prudentes, não substitui a firmeza, não torna possível a serenidade, não oferece perspectiva de que a vida seja plena e ampla e livre. E as coisas desandam, mesmo que banhadas em chocolate: frutas ácida recoberta de açúcar. Nem autonomia, nem coragem, nem dinheiro (ainda que tudo isso em abundância): de nada adiantarão os caminhos de sempre quando são mundos novos que se abrem. Bom mesmo é deixar de ser ambíguo, essa coisa que se enrosca em nossas pernas e nos fala em rimas estranhas que unem totoro e oroboro como se houvesse sentido. Ambiguidade é uma forma de perder a trilha. Ambiguidade é ficar parado no centro da encruzilhada.
E a verdade, como um apêndice, é o alicerce do silêncio.
Como um chinês que nos olha de dentro de hieróglifos que não compreendemos, como um tutu sem passo de dançarina, como um amor sem ser que ama, como um astronauta no instante em que a gravidade se ausenta do centro de leveza de seu corpo – não há o que possa criar movimento onde reina o imobilismo. A vida, então, são farpas espetadas no âmago da carne do outro.